"...Quem frequenta a Costa Nova, ou quem por ela passa para apreciar uma das salas de visita do concelho de Ílhavo e da Região, talvez nem costume parar junto ao busto do arrais Gabriel Ançã, ali colocado em 1933. E seria bom princípio que todos nos habituássemos a descobrir as figuras gradas da nossas terras, para com as suas histórias aprendermos atitudes de dedicação e de abnegação para com gentes e comunidades. Cunha e Costa, em "Paisagens, perfis e polémicas", escreveu sobre o arrais Ançã, conforme pude ler na "Geografia de Portugal" de Amorim Girão, que ele "salvou para cima de cento e vinte vidas. Ainda novo, perdido estaria a tripulação da barca francesa Nathalie se não fora ele. A mulher do capitão, desvairada pelo terror, atirou-se do convés para o mar: recebeu-a o Ançan (sic) nos braços. Pesava menos que um lenço de assoar, mas como vinha tocada do alto, ainda me fez arrear um bocado os cotovelos". "... Ainda garoto foi dos que foram buscar a Senhora D. Maria II a Ovar. O Senhor D. Luís qui-lo para seu arrais. 'Ainda estou novo, meu Senhor, e aqui não há quem me substitua'. Como intermináveis formalidades burocráticas lhe entravassem, durante três anos, a pensão requerida, tirou-se dos seus cuidados e partiu para Lisboa com dez tostões no bolso... Chegado às Necessidades, respondeu ao familiar de serviço: 'Diga a sua Majestade que é o Ançan, e verá como ele me recebe logo'...E da visita ao Senhor D. Carlos, só lhe ficou o remorso de ter saído de proa, isto é, de costas para o Rei. 'Foi atrapalhação na manobra!'". "Chegou a ver todos os filhos, três, arrais como ele; e era lindo, comovedor e exemplar, ver sair, ao mesmo tempo para o mar, quatro companhas, de quatro Ançans. E se deixou a faina não foi porque já não pudesse fazer-lhe frente. 'Ainda me não assusto, mas já não salto para bordo nem acudo às aflições com a prontidão de outros tempos' e, 'tendo levado a vida a salvar gente, não quero arriscar-me a que me salvem a mim'". O arrais Ançã, que nasceu em Ílhavo, em 8 de Janeiro de 1845, e morreu em 1930, merece ser mais lembrado. E a propósito, João Sarabando, aveirógrafo inesquecível, escreveu em 1962 que "numerosos escritores, oradores e artistas - Luís de Magalhães, Cunha e Costa, Rocha Martins, António de Cértima, Jaime de Magalhães Lima, João Carlos Celestino Gomes, Maia Alcoforado, Abel Salazar e outros, outros muitos - fixaram o perfil do invencível e cândido arrais. Vários desses retratos são maravilhosos, mereciam ser enfeixados delicada, terna, amorosamente, num volume bioiconográfico. Publicá-lo, equivaleria a levantar outro monumento, formoso monumento, ao 'herói do mar' da terra ilhavense, das terras da velha ibéria que o Oceano enlaça. A ideia já surgiu, mas é ainda sonho. Oxalá se corporize". Não sabemos se isso aconteceu, mas ainda estamos a tempo de homenagear o 'herói' ilhavense...."
Texto da autoria do Professor Fernando Martins
5 comentários:
PONTO DE ENCONTRO é um blog de visita obrigatória. A sua elevada qualidade, o grande interesse dos assuntos que aborda e a evidente sensibilidade da sua autora, assim o determinam. Daí este meu comentário, que ouso considerar ser um pequeno contributo para a sua melhoria - se tal me é permitido, claro.
Acho excelente ideia a divulgação de textos de autoria de figuras destacadas e que contribuem para o enriquecimento cultural da nossa memória colectiva. Refiro-me, por exemplo, ao texto de José Sarabando, cidadão exemplar, aveirense de alma e coração que muito gostava de Ílhavo, onde contava imensos amigos, sobre essa figura ímpar de filho de Ílhavo que foi o Arrais Gabriel Ança; ou o texto do ilustre oficial da Marinha Mercante capitão Mário Esteves, a quem os pescadores de Ílhavo tanto devem pela sua acção humanitária como comandante de um dos ícones da Faina Maior que foi -e felizmente ainda é- o Navio-hospital Gil Eannes.
E aonde quero chegar? À excessiva extensão das transcrições -os chamados "lençóis"- de artigos como os que anteriomente mencionei que, atenção, cito apenas porque são os mais recentes e só por isso, já que são excelentes. Por vezes, a unidade do texto, como até será o caso dos que refiro, "obrigará" à sua publicação num único post. Ficam um pouco "pesados" de ler. No caso presente e apesar de bonito, até pelo pouco contraste de cores entre a escrita e o fundo.
Parece-me que a temática base deste blog "não se dá bem" com textos muito longos e muito especialmente se graficamente "difíceis" de ler. É a minha opinião, claro. Vale o que vale.
Se inevitável, aí terá que entrar em acção a arte e a imaginação da autora, repartindo o texto, espaçando as suas partes, criando separadores, usando diferentes tipos de letra, escrevendo parágrafos com cores diferentes, intervalando fotografias ou desenhos, sei lá. Já que não sou especialista na matéria, estes tópicos são apenas "palpites" de um leitor interessado, "carregados" de boas intenções (embora digam que o Inferno também o está...).
Parabéns à Marieke por este belo e apaixonante blog. Ílhavo e os ilhavenses ficam-lhe muito agradecidos.
PS: E que tal esta contradição de "contra os posts lençóis" fazer um "comentário lençol"? Bem prega Frei Tomás...
Fermosa i emotiva a historia do filho de Ílhavo, o Arrais Ançã.
O monumento en pedra que o lembra , teno moi ben merecido.
Aprtas
Em primeiro lugar ...obrigada pelos elogios ao blog...não sei se sou culta nem se sou sensível...é fácil fazer este ou outro blogue quando se escreve ou divulga "coisas" que nos apaixonam ou se fala de gente de quem gostamos ou se divulgam notícias sobre eventos ou pessoas que nós admiramos.
Então vamos por partes:
-Os "lençóis"existem e eu tenhonoção da chatice às vezes de os ler..mas isto é defeito de formação..sempre habituada a não estragar...não alterar..não copiar nada que não seja meu...
-A monotonia das cores ..vou aprendendo ainda não domino estas "minhoquices"todas..só tenho 6 meses ...ehehehhe
Mas prometo estar atenta e tomar em conta as suas dicas...principalmente porque concordo com as críticas construtivas que me fez
O meu Ponto de Encontro dá-me gozo fazer mas ainda mais partilhar...Sem comentários os blogues morrem..espero sempre a sua visita..Obrigada
Homes de Pedra..quando era pequenina a estátua deste grande homem era só o meu lugar preferido de brincadeiras...hoje conheçoa sua História e sim é uma História e sim é um dos muitos Ilhavenses de que a nossa terra se orgulha
Presumo - tenho a certeza, mas aqui fica bem escrever assim - que quando a Marieke era pequenina, a estátua do Arrais estava no chamado Largo da Marisqueira, que agora é menos largo do que então...
Bom local para as brincadeiras da garotada. O palheiro do sr. Portugal e da Dª Berta, a "mota" e as suas barcas, etc, etc.
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