terça-feira, 28 de junho de 2011

UXÍA...CANTOS NA MARÉ

UXÍA...a Galega preferida do PONTO DE ENCONTRO

Pesca do bacalhau

Pesca do bacalhau

Pesca do bacalhau na Época das Descobertas




















Mapa da terra Nova, onde se registam as actividades de portugueses e franceses.


O bacalhau foi um peixe que, durante muitos séculos, existiu em grande quantidade em todo o Atlântico Norte, desde as costas do Canadá à Noruega. A sua abundância era tal que os Vikings, nos primeiros anos que viveram na Gronelândia, cantavam nas suas sagas a grande quantidade de bacalhau que, diariamente, na maré cheia, enchia os fiordes. Em alguns locais, os cardumes eram tão grandes que a água parecia ferver.

Não se sabe ao certo quando começou a pesca do «fiel amigo» e é mesmo possível que tenha sido pescado desde a antiguidade por vários povos. Infelizmente, hoje, os indícios coevos mais antigos surgem somente no século VI DC.

Entretanto os Vikings, habitantes dos Fiordes da Escandinávia, guerreiros e navegadores de coragem indomável, que desenvolviam já, desde o Século IV, uma mestria náutica superior à dos povos da sua época, iniciaram a sua expansão assolando as costas da Europa, chegando mesmo a entrar no Mediterrâneo.

Em 983, Erik «o Vermelho», ao ser desterrado da Islândia, navegou para oeste, atingindo uma terra arborizada e coberta de bons prado, a que chamou Greenland (Groenlândia). Regressado à Islândia, Eric formou uma armada de 27 navios e partiu para a terra descoberta, onde se instalou.

Cerca do ano 1000, seu filho, Leif Ericsson, que herdou do pai o espírito aventureiro, navegou para sul. Saído da Groenlândia, atingiu novas terras que designou por Waldland, Helluland, Markland e Vineland, as quais, possivelmente, são a Terra Nova, a Nova Escócia, o Lavrador e a Nova Inglaterra dos nossos dias.

Logo após estas descobertas, os Vikings instalaram-se nas novas terras, que mantiveram colonizadas por alguns séculos, como cantam as Sagas Escandinavas.

Há conhecimento de outros aventureiros que, ainda no século XII, procuraram aquelas tão apetecidas terras do norte, sendo de destacar os Irmãos Errantes ou Aventureiros, que saíram de Lisboa em 1170, e os Irmãos Frison, embarcados em Breme, mas não há dados seguros que confirmem essas viagens e a pesca do bacalhau já nessa época. Sabe-se também que, em 1261, o Rei da Noruega, vendo o interesse de vários países pelas novas terras, tomou para sua dependência a Groenlândia, demonstrando que a descoberta era efectiva, monopolizando com a Dinamarca o comércio daquela região. De qualquer modo acabaram ao fim de algum tempo por negligenciar essas colónias de além mar, conquistadas pelos seus ancestrais.

Possivelmente, ao mesmo tempo, os pescadores lusos tinham já conhecimento dessas descobertas, pois contactavam muitas vezes com marinheiros do Norte que frequentavam os nossos portos, sendo, na altura, o da foz do Vouga um dos mais privilegiados pois era de fácil acesso, tinha vários esteiros abrigados com fontes de aguada e era frequentado por grande numero de navios que vinham carregar sal e outros produtos da região.

Apesar de não haver hoje qualquer indicio de pesca do bacalhau, logo no início da nacionalidade, há conhecimento de alguns contactos entre os nossos primeiros reis e os nórdicos, tendo-se realizado mesmo casamentos de princesas portuguesas com príncipes da Dinamarca e Holanda, como por exemplo o de uma das filhas de D. Sancho I com o rei dinamarquês Valdemar II.

No Século XIV, no reinado de D. Pedro I, os portugueses pescavam já nas costas de Inglaterra e nos mares setentrionais, tendo sido obtida, em 1353, do rei Eduardo II de Inglaterra, uma licença para pescar e frequentar os seus portos.

Possivelmente por esta razão e devido ao grande incremento das navegações comerciais que da Ria de Aveiro para o norte da Europa, é que, no século referido, nasceu em Ílhavo, no seu termo, a Confraria de Santa Maria de Sá, uma corporação de pescadores e mareantes que não admitia no seu grémio indivíduos de outras profissões.

Durante o Século XV, homens do mar de Bristol, Italianos, Biscainhos e Portugueses lançaram-se através do Atlântico setentrional, dirigindo as suas actividades piscatórias para uma espécie que já frequentara paragens mais perto das costas europeias e, finalmente, por essa altura, a Corte Portuguesa começou a estar interessada nas terras do norte, tendo o Infante D. Fernando e sua mulher D. Beatriz mandado, em 1473, o navegador açoriano João Corte Real e Álvaro Homem descobrir a «Terra Nova dos Bacalhaus. Vinte anos mais tarde, em 1495, João Lavrador e Pêro de Barcelos chegaram à Groenlândia e à península do Lavrador, ao mesmo tempo que o veneziano Cabot arribava à Terra Nova e, entre 1500 e 1506, os irmãos Miguel e Gaspar Corte Real, seguindo a Rota do seu pai, procurando a tão apetecida passagem Ocidental do norte para o Catai, aportaram à Terra dos Bacalhaus e acabaram por desaparecer algures nos mares gelados do norte, possivelmente no rio S. Lourenço, tendo sido descoberta, no inicio do século XX, pelo arqueólogo canadiano Delabarre, junto ao rio Tautum, a pedra de Dighton, onde existem marcadas algumas inscrições em que alguns historiadores dizem ler: «1511 V, Dei Rex Ind – Miguel Corte Real».
Há ainda conhecimento de muitos outros aventureiros que exploraram o Atlântico Norte, sendo de referir, a título de exemplo, alguns deles: João Álvares Fagundes, Pêro Vasquez, Diogo Teive, Pêro Velasco, Fernão Dulmo, João Afonso do Estreito, Fernão Teles, João Valadão, Baldaia, etc. Segundo Jaime cortesão e a titulo de exemplo, Diogo de Teive, em parceria com o castelhano Pêro Vasquês, ao regressar em Agosto de 1452 dos bancos da Terra Nova, fez o achamento da Ilha do Corvo e Flores, pertencente ao arquipélago dos Açores. De acordo com o texto referido tudo leva a pensar que a deslocação aos bancos do bacalhau era já habitual.

Como referi, houve muitos povos que procuraram as terras dos bacalhaus, tendo muitos deles conseguido os seus intentos. Apesar disso, em 1860, Vilhena Barbosa, no seu livro «As Cidades e Villas da Monarchia Portuguesa», diz a dado passo:

«...Aveiro foi pátria de muitos varões, por actos de virtude, por letras e saber, por viagens e descobrimentos, e enfim, por acções de coragem e valor. Iríamos muito longe, se pretendêssemos fazer catálogo dos seus nomes, e obras. Diremos, porém, que aos filhos d’ Aveiro se deve a descoberta da «península????» na costa setentrional da América, chamada Terra Nova, aonde depois foram por longa série de anos fazer a pesca do Bacalhau,...»

Também numa passagem dum dicionário geográfico de 1873, ao fazer-se a descrição de Aveiro e a sua história, é referida por duas vezes a saga do bacalhau, em páginas diferentes:

«Ainda em 1550 tinha 12:000 habitantes e 150 navios (quasi todos aqui construídos, e sendo alguns naus e galeões.» ...

«Só para a pesca do bacalhau no Banco da Terra Nova (descoberto por navegantes de Aveiro) armava mais de 60 navios.» ...

Já disse que uns nautas daqui descobriram a Terra Nova (ou de Lavrador) na costa septentrional da América.»



Estas linhas que indicam os povos da Ria de Aveiro como descobridores da Terra Nova poderão ter alguma credibilidade, pois a Enciclopédia «Portuguesa e Brasileira» refere a existência de um navegador de Aveiro, chamado João Afonso, que sendo um dos mais arrojados da sua época, foi dos primeiros a alcançar a Terra Nova. A existência deste navegador parece confirmar-se. Em 1552, o Juiz de Fora da Vila de Aveiro, numa carta enviada ao rei, inclui, no rol dos navios existentes na Foz do Vouga, uma nau de 80 tonéis e uma caravela de 60 tonéis pertencentes à viúva daquele navegador, tendo a primeira como mestre um dos seus filhos. No entanto, aquele navegador não deve ser confundido com João Afonso de Aveiro, piloto de Diogo Cão, que descobriu o reino de Benin e acabou por falecer nesta região Africana.

Além das indicações referidas, segundo diziam, na altura, os pescadores Normandos e Bretãos, aportados à Terra Nova, já lá se encontrava uma colónia de pescadores da foz do Rio Vouga, financiada por comerciantes de Aveiro e da Ilha Terceira, que controlava grande parte do litoral desde o início do Século XVI. O resultado da pesca longínqua era tal que a dízima sobre o pescado, mandada cobrar por D. Manuel, em 1506, e referida no Foral de Aveiro de 4 de Agosto de 1515, no caso concreto do bacalhau, deu para pagar as despesas das viagens dos irmãos Corte Reais.

Nessa época partiam anualmente para a Terra Nova cerca de 100 caravelas e naus dos rios Vouga e Lima para a pesca do bacalhau; e, a meio desse século, a Ria de Aveiro, que era um dos portos nacionais mais importantes, suplantando mesmo o Porto, com uma frota de 75 navios (este valor como é referido num documento coevo deve ser mais correcto que o referido na publicação do século XIX referida anteriormente) fazia comércio com a Irlanda e Inglaterra, mas sobretudo seguiam as rotas da Terra Nova.

Mas não se julgue que no século XVI só pescavam nas águas da Terra Nova navios de Aveiro, pois também lá andavam naus de Leça e Viana do Castelo e, cerca de 1580, reuniam-se anualmente, segundo Élisée Reclus, no Grande Banco, trezentos e cinquenta a quatrocentos navios, dos quais cento e cinquenta eram franceses, cem espanhóis, cinquenta portugueses, vinte a trinta bascos e trinta a quarenta ingleses. Segundo o livro de registos da Câmara da vila de Aveiro, num alvará exarado no mesmo livro, fls 10, no ano de 1572, consta que havia na vila estendais para secar e beneficiar o fiel amigo.

Como os navios do Século XVI não tinham geralmente instalações para as tripulações, a existência destas colónias permite pensar que a forma de pesca então praticada seria do tipo sedentário. Os navios ficavam geralmente, durante toda a safra, ancorados em qualquer porto natural e a tripulação instalava-se em terra, pescando diariamente em pequenos barcos ao logo da costa. Há, no entanto, conhecimento de que algumas naus se mantinham ao largo, sendo o bacalhau pescado directamente do seu interior.

Ainda que, ao longo do Século XVI, a pesca do bacalhau continuasse de vento em popa, saindo do Vouga cerca de 60 navios, nos finais desse século os corsário ingleses e franceses começaram a atacar com certa assiduidade os navios regressados da pesca, que geralmente navegavam desarmados e sem protecção. Face à situação em causa, no reinado de D. Sebastião, segundo o regimento de 5 de Novembro de 1571, foi determinado aos navios de pesca a utilização de armamento e as condições em que se deveriam agrupar para sua defesa. Apesar da melhor segurança determinada, conta-se que, em 1585, foram apresados, junto às rias da Galiza, onze naus de bacalhau pertencentes à Ria de Aveiro.

É mesmo conhecida a história do piloto Marcos Vidal, que recebeu em 1586 uma tença anual do Rei D. Filipe, porque depois de ver o seu bacalhoeiro apresado por corsários ingleses conseguiu libertá-lo e capturar mesmo os assaltantes.

Estas acções de corso, aliadas à ocupação da Terra Nova, em 1583, pelo inglês Gilbert Raleigh, a destruição da maior parte dos navios portugueses na «Invencível Armada», o assoreamento da foz do Vouga e as dificuldades que a Coroa tinha com a segurança da Rota da Índia terminaram com a participação de Portugal na pesca longínqua e, como hoje, o bacalhau consumido pelos portugueses passou a ter origem estrangeira, proveniente, principalmente, de Inglaterra e das suas colónias Americanas.

Portugal esteve cerca de dois séculos e meio sem pescar o «fiel amigo», mas, durante esse longo período, os povos da Ria de Aveiro e, entre eles os Ílhavos, vendo o seu porto de abrigo encerrado, lançaram-se ao longo da costa nacional, criando novos pontos de pesca costeira, desde Matosinhos ao Algarve, formando uma diáspora de lobos do mar audazes, referida por Almeida Garrett e outros escritores nacionais. Foi essa diáspora, juntamente com outros pescadores portugueses que, na terceira década do século XIX, participaram no arrancar da nova safra do bacalhau. E os Ílhavos, que ficaram no chão onde nasceram, quando sentiram a barra artificial da Ria de Aveiro razoavelmente segura, lançaram-se novamente na pesca longínqua, deixando para outros as areias douradas das praias, os seus barcos «meias luas» e as redes costeiras.

António Angeja

terça-feira, 14 de junho de 2011

domingo, 12 de junho de 2011

As duas grandes de Espanha

Quadros da Costa Nova (1945)-No Café Coração da Praia





















Painéis pintados em 1945 existentes no Café Coração da Praia, que foi propriedade do meu avô José Ucha Otero, e que nos mostram aspectos da praia da Costa Nova em 1945. Pinturas com a assinatura Bloco Artístico, Aveiro, 1945.

Fora de Bordo - olhares sobre o Mar Português-Até 2 de Outubro de 2011













Fotografias de Angus McBean Burt Glinn Bill Perlmutter Edouard Boubat Federico Patellani Gérard Castello-Lopes Guy Le Querrec Jean Gaumy Leon Levinstein Louis Stettner Peter Fink Sabine Weiss Weber Wolfgang Sievers

Aquilo que hábito ou por limitação do olhar tendemos a classificar como “marítimo”, consiste afinal numa confinada maneira de ver e de representar, como se a praia já fosse mar e nela habitasse toda a vida marítima.
“Fora de bordo” sintetiza metaforicamente esse modo de ver e sentir o mar, a tendência para o olharmos de fora, da terra para o oceano, sem o enlace romântico que a litoralização das sociedades remeteu para a espuma da memória e para visões exóticas de comunidades humanas que, em rigor, não conhecemos.
Uma pesquisa sobre as diversas representações de imagem que artistas, repórteres e cientistas sociais estrangeiros construíram sobre as comunidades marítimas portuguesas na segunda metade do século XX acabará por evidenciar uma menor dissidência no olhar do que podíamos supor. Se nos limitarmos ao modo como a fotografia feita por estrangeiros registou e representou as comunidades de pescadores portuguesas nesse quarto de século que decorreu entre o termo da II Guerra Mundial e a transição para a Democracia em 1974-76, encontramos belíssimas fotografias, a exemplo das que aqui se mostram, identificamos artistas importantes, alguns deles da Agência Magnum, depreendemos que o “mar português” interessou territórios artísticos que não se inscreviam no reduto oficial do regime salazarista, cuja propaganda, antecipada e oficiosamente, se incumbiu de fotografar e filmar as “gentes do mar nacionais”.
Observando estas vinte e quatro fotografias de treze artistas diferentes, muitos também fotojornalistas, apetece perguntar por que se fizeram às praias de Portugal a fim de as representar povoadas de barcos e pescadores?
Espécie de lugar de síntese do “mar português”, a Nazaré foi o laboratório favorito dos fotógrafos que vieram e voltaram, transmitindo a outros, com certeza, que certas imagens só ali se podiam ainda fazer. Nos anos cinquenta e sessenta, as enseadas e praias de pescadores portuguesas eram lugares de vida e de morte, de conflito e sobrevivência, espaços de fronteira habitados por tipos humanos que a modernização das pescarias já fizera desaparecer noutras paragens do “mundo desenvolvido”. Daí, talvez, a representação visual de sentido exótico que releva de várias fotografias, o privilégio de imagem atribuído às mulheres, aos velhos e crianças que em diversas se nota e, noutras ainda, a construção de imagens de tipo naturalista que nos mostram o mar como cenário e as suas gentes como personagens típicas de um certo imaginário etnográfico.
Exibir estas fotografias no MMI significa suscitar estas e outras questões que se prendem com o jogo social das identidades, ou seja, com o modo plural e inconstante como nos vemos na relação com o outro. Uma cultura marítima aberta e socialmente responsável implica esta arqueologia do olhar.
MMI-A.G.