domingo, 8 de março de 2009

Dia Internacional da MULHER - do homem é todos os dias:( :(:(

Nota da autora:Não quis alterar nem para pôr em "Português de Portugal "as palavras desse grande poeta brasileiro Affonso Romano de Sant'Ana.

Mulher Madura

O rosto da mulher madura entrou na moldura dos meus olhos.De repente, surpreendo-a num banco olhando de soslaio, aguardando sua vez no balcão. Outras vezes a entrevejo no espelho de um joalheria. A mulher madura, com seu rosto denso esculpido como o de uma atriz grega, tem qualquer coisa de Melina Mercouri ou de Anouke Aimé.Há uma serenidade nos seus gestos, longe dos desperdícios da adolescência, quando se esbanjam pernas, braços e bocas ruidosamente. A adolescente não sabe ainda os limites do seu corpo e vai florescendo estabanada. É como um nadador principiante, faz muito barulho, joga muita água para os lados. Enfim, desborda.A mulher madura nada no tempo e flui com a serenidade de um peixe.O silêncio em torno de seus gestos tem algo do repouso da garça sobre o lago. Seu olhar sobre os objetos não é de gula ou de concupiscência. Seus olhos não violam as coisas, mas as envolvem ternamente. Sabem a distância entre seu corpo e o mundo.A mulher madura é assim: tem algo de orquídea que brota exclusiva de um tronco, inteira. Não é um canteiro de margaridas jovens tagarelando nas manhãs.A adolescente,com o brilho de seus cabelos, com essa irradiação que vem dos dentes e dos olhos, nos extasia. Mas a mulher madura tem um som de adágio em suas formas.E até no gozo ela soa com a profundidade de um violoncelo e a sutileza de um oboé sobre a campina do leito.A boca da mulher madura tem uma indizível sabedoria. Ela chorou na madrugada e abriu-se em opaco espanto. Ela conheceu a traição e ela mesma saiu sozinha para se deixar invadir pela dimensão de outros corpos. Por isto as suas mãos são líricas no drama e repõem no seu corpo um aprendizado da macia paina de setembro e abril.O corpo da mulher madura é um corpo que já tem história. Inscrições já se fizeram em sua superfície. Seu corpo não é como na adolescência, uma pura e agreste possibilidade. Ela conhece seus mecanismos,apalpa suas mensagens, decodifica as ameaças numa intimidade respeitosa.Sei que falo de uma certa mulher madura localizada numa classe social, e os mais politizados têm que ter condescendência e me entender. A maturidade também vem à mulher pobre, mas vem com tal violência que o verde se perverte e sobre os casebres e corpos tudo se reveste de uma marrom tristeza.Na verdade, talvez a mulher madura não se saiba assim inteira ante seu olho interior. Talvez a sua aura se inscreva melhor no olho exterior, que a maturidade é também algo que o outro nos confere, complementarmente.Maturidade é essa coisa dupla: um jogo de espelhos revelador.Cada idade tem seu esplendor. É um equívoco pensá-lo apenas como um relâmpago de juventude, um brilho de raquetes e pernas sobre as praias do tempo. Cada idade tem seu brilho e é preciso que cada um descubra o fulgor do próprio corpo.A mulher madura está pronta para algo definitivo.Merece, por exemplo, sentar-se naquela praça de Siena à tarde acompanhando com o complacente olhar o vôo das andorinhas e das crianças a brincar. A mulher madura tem esse ar de que, enfim, está pronta para ir à Grécia. Descolou-se da superfície das coisas. Merece profundidades. Por isto, pode-se dizer que a mulher madura não ostenta jóias. As jóias brotaram de seu tronco, incorporaram-se naturalmente ao seu rosto, como se fossem prendas do tempo.A mulher madura é um ser luminoso, é repousante às quatro horas da tarde, quando as sereias se banham e saem discretamente perfumadas com seus filhos pelos parques do dia. Pena que seu marido não note, perdido que está nos escritórios e mesquinhas ações nos múltiplos mercados dos gestos. Ele não sabe, mas deveria voltar para casa tão maduro quanto Yves Montand e Paul Newman, quando nos seus filmes.Sobretudo o primeiro namorado ou o primeiro marido não sabem o que perderam em não esperá-la madurar. Ali está uma mulher madura, mais que nunca pronta para quem a souber amar.

5 comentários:

Anónimo disse...

Um dia Feliz para si e para todas as Mulheres do Mundo.

Ana Maria Lopes disse...

Obrigada, Maria.
Desejo-te igualmente um Feliz Dia da Mulher.Gostei de ler o texto que escolheste.
Um abraço
Ana

Paulo disse...

Felicito-a pela homenagem que faz àquelas mulheres que, num tempo de celebra sobretudo a "juventude", a imaturidade e a futilidade, são tornadas socialmente invisíveis.

Marieke disse...

Obrigada jc...beijinhos Ana,,,parabéns pelo seu blogue Paulo
Um abraço
Marieke

José Leite disse...

Cara Marieke:

A mulher balzaqueana, a fruta madura, em todo o seu esplendor!
Parabéns pela citação de um naco de prosa tão cheio de poesia...